sábado, 28 de novembro de 2009

"Whisky" por Lucas Andrade


Era engano” “É, às vezes acontece”. “Digam whisky”. Um homem que abre sua fábrica todo dia no mesmo horário. Um vendedor que sempre pergunta sobre o time do cliente. Um bolo que gira da mesma forma em uma vitrine e chama a atenção de transeunte. O dono da fábrica, o cliente, o homem que se encanta com o bolo, que sempre responde que às vezes acontecem enganos e que diz whisky ao tirar fotos é Jacobo. Sua vida parece ter uma rotina preestabelecida, e realmente tem, porém, a chegada do seu irmão irá impor um novo padrão em sua vida, pelo menos no tempo em que ele permanecer lá.

Pode parecer estranho que “Whisky”, esse filme singular, tenha sido feito no Uruguai. Ao se perguntar para um grupo de pessoas quantas já assistiram produtos audiovisuais desse país, pouquíssimas, talvez nenhuma, dirão que já. Então, era de se esperar que isso ocorresse por conta da baixa qualidade da produção, porém, essa obra mostra o contrário. Com um cinema naturalista e que se preocupa com a micro-esfera, “Whisky” conseguiu sair do Uruguai e chamar atenção do mundo, tendo inclusive ganho prêmios internacionais, como no festival de Cannes.

No filme, Jacobo, um velho ranzinza, pede a ajuda Marta (sua empregada e, de uma forma estranha, sua amiga) quando sabe da chegada do seu irmão Herman ao Uruguai. Ele pede para que ela finja ser sua esposa. Não se diz de forma exata o porquê dessa mentira, mas parece claro que Jacobo precisa de alguma maneira mostrar a Herman que conseguiu levar sua vida no Uruguai de forma bem sucedida. Há uma tensão na relação desses irmãos, eles parecem se falar apenas pela obrigação do parentesco. Até a troca de presentes parece falsa (e previsível, já que ambos dão os mesmos presentes um para o outro na ida e na volta).

É esse cinema naturalista o que mais chama a atenção no filme. E ele parecia prever o que estava por vir (ou talvez já fosse reflexo disto): o “cinema romeno” que mostrou ao mundo obras bastante cruas e reais. Como no “cinema romeno” atual, “Whisky” mostra uma situação, porém, ela nunca é o mais importante. O que chama atenção do espectador são as tensões e as reações dos personagens, que tem um grande grau de realismo. Não é preciso saber porque que Jacobo é ranzinza, nem porque Herman não pode ir para o enterro da mãe, porém, é impossível não notar as expressões de desgosto que Jacobo transparece ou o ressentimento dele por seu irmão não estar presente na morte da mãe.

Existem elementos que são mostrados de forma bastante suave e talvez passe despercebido por alguns. São ações como: basta Hermam ir embora e Jacobo logo separa as camas recolocando-as na posição do começo do filme. É após a partida do seu irmão também que ele volta a tomar café no bar, que ele recomeça a chegar cedo na fábrica. Todas essas situações tentam mostram que Jacobo está tentando voltar a sua rotina, porém, algo que foge do controle dele acontece. Marta não mais chega cedo e parece que nem se quer irá chegar. Ela parece ter “fugido” para viajar e ser livre com o dinheiro que ele dera para ela. Como defende a teoria de Syd Field, o filme começa quando tudo está normal, algo acontece e no final tudo volta ao habitual, porém, é um habitual em que nem tudo é igual a como era antes. Em resumo, é isso o que realmente acontece em “Whisky”, porém, o fato de estar dentro dessa “fórmula” não faz dele um filme menor.

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