sábado, 5 de dezembro de 2009

“Whisky” por Rafaella Cavalcanti


Solidão, monotonia do cotidiano, inércia dos personagens, mecanização do ser humano. O tempo circular. Tudo isso perdura no premiado “Whisky” (2004) de Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll.

A história é simples. Jacobo (Andres Pazos) é um homem de seus 60 anos que reside em Montevidéu, Uruguai. Vive sozinho e trabalha todos os dias em sua pequena fábrica de meias. Marta (Mirella Pascual, em brilhante atuação), 48 anos, é supervisora da fábrica e todos os dias espera na porta, exatamente no mesmo lugar, para Jacobo abri-las. A mesma rotina. Ligar as máquinas, preparar o chá, ajeitar as persianas. Tudo isso bem frisado por cenas demoradas e planos algumas vezes repetidos. Quando chega Herman (Jorge Bolani), o irmão de Jacobo que está há mais de 20 anos morando em Porto Alegre com a família. Ele também possui uma fábrica de meias, mas aparentemente os negócios vão bem melhor que os do irmão. Ele vem para a matzeiva da mãe, que os judeus fazem para a colocação da pedra do túmulo. Jacobo, por vergonha ou mesmo por algum instinto competitivo entre irmãos, pede que Marta se passe por sua esposa enquanto Herman se hospeda em sua casa.

É nesse fiapo de narrativa que “Whisky” se firma, marcado acima de tudo pela delicadeza, somado ainda à um humor peculiar. Aquela inércia dos personagens reflete-se nos cenários, nos carros velhos, nas poucas pessoas da cidade. Tudo lembra um Uruguai que já viveu melhores dias.

Os pequenos detalhes que vão sendo descobertos sobre cada personagem, tanto o espectador como eles mesmos, tornam-se mais próximos, gerando uma nova percepção sobre quem são aquelas pessoas, mas principalmente o que as fazem estar ali envolvidas naquela prisão de rotina que acabam por acomodarem-se.

Se a promessa da poética do cotidiano ordinário no cinema latino-americano de fato é uma promessa, o filme está em suas melhores definições. É um melodrama discreto, mas tão capaz que tentar inserir elementos que o deixasse “convencional” talvez simplesmente não funcionasse tão bem.

O final que surpreende mesmo sem grandes reviravoltas, é a prova de que fazer o simples ser tão bom pode ser mais difícil do que parece.

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