domingo, 18 de abril de 2010

"O padre e a moça" por Bárbara Araújo


o diretor Joaquim Pedro de Andrade

O Padre e a Moça, dirigido por Joaquim Pedro de Andrade, é um retrato de uma cidade decadente no interior de Minas Gerais, talvez até se possa dizer que é uma cidade esquecida pelo próprio país como tantas outras; um lugar em que seus habitantes também foram esquecidos sem esperanças de mudança, até mesmo para a única personagem jovem do filme, Mariana (Helena Ignez), desejada pela maioria dos homens da cidade, até mesmo por seu pai de criação, que insistia em se casar com ela, mas o padre da cidade reprovava essa união. Mariana, parece conformada com a vida dura que leva ao lado desse “pai” e com o futuro que a esperava ao lado dele. Até que o velho padre morre e um novo padre chega à cidade (Paulo José), este se apaixona por Mariana, mas não consegue aceitar, ele acredita ser pecado; Mariana já não pensa da mesma forma, ela não apenas se apaixona pelo padre, mas também o vê como uma mudança de vida, daquele rosto triste logo no início do filme, surge um rosto esperançoso em Mariana. Os dois amantes tentam fugir juntos, para Mariana é um escapismo, uma chance de ser feliz ao lado de um homem que ela amava, para o padre era a mesma coisa, sendo que ele não admitia por acreditar ser um pecado, ele tenta durante a longa fuga afirmar que só está fazendo tudo para ajudar a moça a fugir de tudo que a oprimia naquela cidade, incluindo os abusos do pai adotivo. Quanto a esse pai, Honorato (Mario Lago), ele é um homem que domina a cidade porque fornece tudo que os pobres moradores precisam em troca de pedras preciosas que esses últimos retiram dessa região da Diamantina.

É interessante que esses três protagonistas se destacam do resto da cidade pela idade e pelos traços físicos, também por que se dão conta da realidade local, coisa que os moradores não parecem ter, estes últimos vêem a situação de desgraça e abandono como algo natural e única possível, enquanto que os protagonistas, no mínimo, sabem que isso não é algo que deveria ser aceito, apesar de não acreditarem numa mudança drástica para melhor.

Apesar de o filme fazer uma denúncia social e política da situação do povo nas cidades esquecidas no interior do Brasil, ele não é um filme necessariamente voltado para isso, como os filmes do cinema novo; ele é primeiramente um filme que desperta o afeto do espectador, retratando sentimentos que o fazem imergir na tela do cinema, na história.

Contudo, o filme foi considerado um fracasso financeiro e extremamente enfadonho, eu creio que isso tenha acontecido pela mudança de temporalidade do filme, que começa num ritmo acelerado e passa para um ritmo lento drasticamente, quando vemos a fuga do padre e da moça; é um filme que começa fazendo bom uso da imagem-movimento, em um segundo momento quebra para a imagem-tempo e ainda teria um terceiro momento, quando eles voltam para a cidade que é um ritmo ainda mais acelerado que no primeiro momento, talvez para dar um misticismo ao filme, que seria quando eles são perseguidos por várias mulheres da cidade, chocadas e enlouquecidas com o acontecimento.

Essas mudanças de ritmo podem incomodar, mas ao mesmo tempo se adequam perfeitamente as sensações dos personagens, aquele ritmo lento e o uso de uma câmera subjetiva enquadrando o padre durante sua longa jornada com a moça, sugere o quanto o mesmo estava “perdido”, sem saber como agir e reagir, enquanto o ritmo acelerado do começo, sem o uso da câmera subjetiva, sugere a determinação ou impassibilidade dos personagens, a certeza de que haveria uma ação e reação a determinadas situações. Nessas mudanças de ritmo, planos, enquadramentos e uso de imagem-movimento alternando com imagem-tempo, nota-se uma construção não apenas brasileira, mas também comum aos países da América Latina, partindo já da história, da simplicidade de seus personagens e sua dura realidade; o uso de muitos planos abertos, planos médios e poucos closes, como no cinema europeu.

Outra coisa que colabora muito com os ritmos do filme é a trilha sonora composta por Carlos Lyra, ela cria uma sensação diferente para cada um dos três momentos, adequando-se ao ritmo de cada um deles sem qualquer problema.

É um filme que tem um efeito agradável sobre o espectador, porque cria sensações, mesmo dentro de um cenário de denúncia social, ele não se distancia do afeto e consegue criar três momentos distintos através do ritmo e da trilha, que podiam assustar e afastar o espectador, mas para mim surpreende e me leva a imergir ainda mais nos acontecimentos.

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