domingo, 18 de abril de 2010

"A Vista no Topo da Montanha" por Filipe Marcena


As imagens que dão início ao filme A Montanha Sagrada, continuação do western El Topo que marcou uma geração na época do Flower Power, são exemplares no que concerne capturar a atenção do espectador e oferecer um índice do que se verá em seguida. Ainda antes dos créditos, duas jovens e vaidosas loiras são despidas e tem seus cabelos raspados por um homem vestido de preto – interpretado pelo próprio diretor do filme, o chileno Alejandro Jodorowsky -, num ritual de purificação inspirado no budismo. Planos inacreditavelmente belos que lembram mandalas, rigor estético assombroso e design de produção impecável explicitam na tela a atmosfera geral do filme.

Um homem que lembra Jesus Cristo passeia pelo México em meio a uma sociedade brutal e desorientada. No caminho cruza com turistas que tiram fotos de um massacre infantil, por um circo que conta a sangrenta história da conquista do México com sapos e iguanas devidamente vestidos, conhece um grupo de “Maria Madalenas”, carrega sua própria cruz e assim por diante. Quando chega numa altíssima torre laranja acaba encontrando seu mestre, um alquimista (Jodorowsky). O mentor o apresenta aos nove homens mais poderosos da Terra e, junto com eles, deverá procurar a montanha sagrada para substituir os deuses que moram lá e tornarem-se imortais.

Jodorowsky faz uma alegoria grotesca, escatológica, transcendental e carregada de simbolismos nem sempre óbvios, mas muito intrigantes. As representações surrealistas de certos grupos da sociedade como policiais, empresários e socialites são abertamente críticas, mesmo que a viagem do filme esteja mais próxima do fantástico e longe do real. Chocante mesmo é o quão A Montanha Sagrada é anticristão, com várias alfinetadas à igreja católica (que tal um Papa dormindo agarrado com uma estátua de Jesus Cristo?) e ao cristianismo. Para Jodorowsky a busca pelo esclarecimento espiritual começa em si mesmo, e se a piada metalingüística ao final soe um tanto anticlimática, é poderosa em sua verdade.

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