sábado, 4 de junho de 2016

"Matou a família e foi ao cinema", por Camila Queiroz Bezerra


 

             O objetivo desse artigo é analisar as características das películas latino americanas na época e as ações sócio/culturais do filme matou a família e foi ao cinema, dirigido por Júlio Bressane, filmado e lançado em 1969.

             O filme consiste em uma série de episódios aparentemente desconectados, mas que giram em volta de uma mesma questão, o assassinato e a sua idealização. Logo no início do filme, um rapaz (Antônio de oliveira), que vive uma vida econômica mediana, está nitidamente cansado das discussões contínuas de seus pais e, portanto, resolve matá-los com uma navalha.  Ele resolve assistir “perdidos de amor” logo após cometer o ato, que fala de duas mulheres que tiram dias de descanso juntas num casarão isolado e terminam por se apaixonar.

           A narrativa, agora, concentra-se na figura das duas mulheres, praticando uma nítida metalinguagem (cria um filme dentro do próprio filme). Ainda ocorre uma nova metalinguagem quando as duas moças citam o nome do filme na própria película, quando observam as semelhanças delas e das “personagens”.

      Filmado em apenas 12 dias, Júlio Bressane era adepto ao “cinema imperfeito” e de baixa renda, muito popular na América latina no início da década de 60 e final de 70. Devido ao parecido cenário político e social dos países, no início dos anos 60, tornou-se popular uma forma diferente de fazer filme, se contrapondo aos cinemas industriais e colonizadores, precisamente dos Estados Unidos e Europa. O cinema imperfeito ressalta a realidade social vivida pela maioria dos países latino americanos, sendo exaltado, portanto, um nacionalismo, visto que as maiorias dos diretores não aperfeiçoavam a realidade, algo comum nos filmes de indústrias na época e, ao invés disso, reafirmavam seus subdesenvolvimentos. Os mais adeptos a esse estilo cinematográfico aderiam-se à esquerda política, que abasteciam seus filmes com muitas mensagens políticas, uma grande descolonização cinematográfica, promovendo, portanto, romper com todo o conservadorismo estético, valorizando ao máximo o cinema “cru” e a identidade de cada país, como reforça Mariana Martins Villaça (2008):

        a criação de um novo cinema latino-americano que fosse esteticamente original, consolidasse uma identidade própria no panorama internacional, e que tivesse como projeto subjacente a reflexão sobre os problemas peculiares à América Latina como o subdesenvolvimento, o abuso de poder, as grandes desigualdades sociais, o autoritarismo, a luta pela democracia e, tangenciando todas essas questões, o papel intelectual e o artista nesse contexto.  (Villaça, 2008)

 

    Vimos muito dessa desconstrução citada olhando a forma em que o filme é filmado, considerado um filme “sujo” por muitos, as filmagens quebravam com todas as convenções imagináveis que eram tidas como “corretas” para a época. A sonoridade direta, que muitas vezes ocorre de não conseguirmos ouvir com precisão o que é falado, o foco da câmera às vezes perdido, torna o filme de Bressane agressivo para a época.  O melodrama é visto no filme, muito comum nos filmes latino americanos na primeira metade do século XX, principalmente nas cenas em que ocorrem os assassinatos.  A técnica de deixar o filme ser conduzido naturalmente, com poucas intervenções, impulsionado e popularizado devido às semelhanças sociais e política dos países latinos americanos, tornou o movimento do cinema imperfeito, um dos marcos da história do cinema da América Latina, dando a ele um caráter de extrema peculiaridade internacionalmente. O próprio autor diz:

      Na verdade, quando você dirige um filme, você faz uma coisa que não sabe o que é. Se soubesse, talvez não o fizesse, porque perderia o prazer. Você faz se livrar algo que não sabe bem o que é. Você conduz o processo criativo só até um determinado ponto, a partir dali é ele que te conduz. Eu procuro interferir no mínimo possível nesse processo. (Júlio Bressane)

 

O final da película, recheada de melodrama, ao som de Roberto Carlos, retrata o final do filme “perdidos de amor”, em que as duas amigas atiram uma na outra, consequentemente morrendo. No final da cena, a música emperra numa parte de extrema importância para a cena, em que é falada repetidamente a frase “em te perder”.

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