Ambientado numa época imprecisa da história quando
ainda existiam cangaceiros, Lima Barreto conta a história do capitão Galdino
Ferreira e seu bando, que após saquearem uma cidade, acabam sequestrando a
professora Olívia. A moça chama a atenção de Teodoro, que também faz parte do
bando, que decide ajudá-la a escapar.
A exaltação a terra é feita da cena inicial até os
créditos finais. Porém, chega a ser tão exagerada em alguns momentos, que no
final o filme parece mais uma colcha de retalhos de ícones nacionalistas
escolhidos a dedo para agradar tanto a um público brasileiro em busca de
entretenimento quanto para saciar a curiosidade de um público estrangeiro. O
que acaba produzindo uma obra muito distante de uma representação mais
contundente da realidade complexa do sertão brasileiro para se refugiar em uma
produção romantizada. Uma busca por uma identidade nacional pautada em
estéticas estrangeiras e mais preocupada com sua espetacularização acaba por
converter sua própria cultura em produto.
Sendo uma mistura de western americano com alguns
elementos do melodrama, a estética do Lima Barreto só “convence” como
brasileira graças ao uso desses símbolos tão caricatos da nossa cultura, o que,
ironicamente, é também o que afasta a produção de ser verdadeiramente nossa.
Temas tão recorrentes da nossa sociedade foram abordados, porém de maneira
superficial e um tanto dramática.
A religiosidade tão presente nos cangaceiros foi
abordada, porém logo ironizada após Galdino roubar o cavalo de um padre. Se
durante o saque a pequena cidade a personagem pareceu mais ambígua ao se
preocupar com a senhora que teve sua cabra leiteira morta, e soltando pássaros
presos em gaiolas, toda essa complexidade se perde no momento em que o
confronto entre o capitão e Teodoro começa a aparecer de forma tão dicotômica.
A sutileza desse grupo social, ora mocinho,ora bandido acaba se perdendo.
Claro que as condições de produção colaboraram para
esse retrato mais comercial. Produzido pela companhia cinematográfica Vera
Cruz, o filme realmente foi feito com o intuito de conquistar público
estrangeiro, no que foi bem sucedido. A mistura do ambiente exótico da
caatinga, as figuras quase místicas dos cangaceiros, e até mesmo a presença de
um índio no que seria o sertão, prendem a atenção do espectador alheio à
realidade brasileira. Esse apanhado de símbolos do imaginário popular
comprometem a própria diegese do filme.
Mesmo sendo anterior ao cinema novo e a EZTÉTYKA DA
FOME, é impossível não comparar essa obra a “Deus e o diabo na terra do sol” do
Glauber Rocha. Lima Barreto parece se contentar em saciar a curiosidade do
colonizador a que Glauber se refere no início do texto. Uma curiosidade pelo
exótico mas que ainda mantém uma distância segura, pois o opressor nunca
poderia realmente compreender o oprimido. O mais preocupante porém, é a
preguiça de Barreto de tentar criar uma linguagem verdadeiramente nacional.
Enquanto “O cangaceiro” aborda seus temas de forma extremamente romantizada, o
segundo filme possui uma estética mais crua e revolucionária.
Como já dito anteriormente, vários elementos do
melodrama estão presentes. O casal perseguido pelo vilão, a redenção do
mocinho, a mocinha pura. Os diálogos cheios de drama e frases de efeito.
Mesmo que o
distanciamento da estória contribua para a criação de um mito, a distorção da
realidade é muita para ser ignorada. Galdino, inspirado em Lampião, tinha
potencial para ser um cangaceiro de verdade. Pena que terminou sendo apenas um
vilão de novela.
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