segunda-feira, 22 de novembro de 2010

"Memórias do Subdesenvolvimento", por Márcia Roberta Martins




O ano é 1961, o momento histórico é pós – revolução cubana e o momento de Sergio Corrieri, personagem principal do filme Memórias do Subdesenvolvimento, é o reconhecimento de um país e de sua população, que não via como compatriotas seus.

Esse “reconhecimento” é a base da narrativa de Memórias do Subdesenvolvimento dirigido por Tomás Gutiérrez Alea, filme de 1968. Mesmo sendo filmado quase 10 anos depois da instauração da Revolução em 1959, mas – como dito acima – a obra se passa no ano 1961, ano de turbulências como a quase invasão da Ilha Cubana pelos Americanos do norte, aliados por sua vez aos cubanos exilados nas terras do Tio Sam.

No entanto, o exílio do qual o filme retrata é o exílio pessoal e esta é uma das leituras que a película permite fazer. O exílio gradativo, opcional e pessoal, pelo qual a personagem principal passa dentro do seu próprio país. Diferente do exílio opcional dos seus parentes: pai, mãe e ex-esposa que o “deixa” para trás, bem como alguns de seus amigos. Todos “fugindo” da situação em que Cuba estava mergulhando, pois os mais abastados não queriam viver em uma terra para qual o mundo virava as costas. Assim, a alta classe cubana se recusava a ser vista como parte da massa populacional também cubana, partindo a grande maioria para Europa e para países como França – o destino preferido pela grande maioria, pelo simples motivo de que a burguesia cubana acredita ser o local ideal para viver.

Sergio, por sua vez, mesmo continuando na agora Cuba comunista, parecia não estar vivendo aquela realidade. Pelo contrário, ele demonstra total desprezo para os fatos ao seu redor. Sua vida continuava a mesma, ou seja, um homem de posses, vivendo a base dos pagamentos dos aluguéis das suas casas, freqüentador de exposições de artes e de livrarias. Isso mostra que mesmo não saindo de Cuba ele era um exilado e não via a nova Cuba que surgia, mas preferia “ver” a velha Cuba na qual sempre viveu.

Esta sua visão particular sobre seu país continua por todo o filme. É como se sua vida caminhasse paralelamente à revolução que mudava a maneira de viver em Cuba. A revolução, desde que o Estado não fosse interferir em sua vida cotidiana, para Sérgio, era algo distante. Entretanto o atingia sem que o mesmo percebesse, uma vez que ele vivia isolado no seu espaçoso apartamento de classe média tendo como vista da sua imensa janela uma estrada pela qual passavam carros particulares fora de linha e tanques militares. Janela que o presenteava com outra vista, vista esta do silencioso horizonte que o oceano atlântico trazia todos os dias aos seus olhos. Silencioso como sua vida que é vivida dentro da sua “ilha particular”. Ele vive na sua ilha dentro da ilha.

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