segunda-feira, 22 de novembro de 2010

“Tangos, el exilio de Gardel" (Fernando Solanas, 1985), por Gibran Khalil




"O Exilio de Gardel” é um daqueles filmes oportunos que surgem em momentos importantes da história e são marcados justamente por este excesso de atualidade. Assim como o clássico de Rossellini, “Roma, cidade Aberta” – desenvolvido ainda com a ocupação alemã em curso e finalizada poucos meses após o fim da guerra – Fernando Solanas desenvolveu seu projeto sobre o exílio ainda em exílio, finalizando-o dois anos após o termino da ditadura militar argentina (83) se tornando assim um manifesto moderno sobre os problemas latino-americanos.

O filme conta o relato de vários artistas argentinos exilados na França – “a capital do exílio, dos milagres e das lágrimas” – que estão a produzir uma peça de “tanguedia” – Tango, comédia e tragédia – intitulada “O Exilio de Gardel”. Ao longo de quatro atos o filme vai desenvolver esta peça como uma metáfora ao próprio filme e, os questionamentos intelectuais em função da peça, como os questionamentos sobre a função do artista exilado frente a contexto político social do seu país.

A história se desenvolve no final dos anos 70 até 83. Período igual ao exílio do próprio cineasta - também na França. Assim, ao descrever a vida de vários artistas exilados, descreve-se a si próprio em suas angústias e tragédias. A produção da tanguédia é a metáfora completa da vida em exílio.

O alter ego de Solanas é o personagem de Juan Dos, responsável por produzir a peça do irmão que ficou na Argentina. Enquanto isso, um francês dirige a peça, tentando impor sua própria estética. Neste período do filme, desenvolve-se uma discussão acerca do que deve ser a estética de uma produção Argentina (mesmo latino-americana). Juan Dos defende a estética da desordem, do não estilo, do “sem fim”, já que o exílio também não tinha fim. A desordem como uma nova ordem, o não estilo como um estilo. É a voz do “subdesenvolvido” que propõe uma nova estética. A discussão termina com o diretor francês queimando “literalmente”, em um acesso de realismo fantástico de Solanas, sua caixa de fusíveis ao tentar compreender esta nova estética.

O filme poderia ser resumido a um musical político. O tema de Gardel vem do fato de várias de suas músicas terem sido censuradas na ditadura, sendo tocadas só no exterior, daí o seu exílio. Ao mesmo tempo que o filme concentra em si toda a discussão estética inerente ao período de florescimento dos cinemas novos, sua temática político militante é bastante clara. Reação ao abatimento do exílio. O terceiro ato é cercado por vozes de protesto que sonham com o país ideal para o qual eles querem voltar.

"O Exilio é ausência. Logo, o exílio existe aqui e lá”. Esta parece ser a máxima de Solanas sobre o exilio ao qual ele mesmo foi acometido. Através de uma tristeza plena, uma preocupação constante, os exilados vivem aparentemente seguros, entretanto, suas mentes, ausentes do seu “conteúdo”, vivem buscando informações do seu país. Assim, exclui-se a possibilidade de relacionar o exílio a uma sensação boa de segurança e conforto. O exílio é uma tragédia, uma desesperança plena, uma deficiência, onde se vive à solidariedade dos outros.

Por fim, crítico acerca de sua própria existência, sobre a vida no exílio e na Argentina, o cineasta escolhe o realismo fantástico para o seu termino. Este gênero narrativo tão comum em nossa literatura latino-americana. Após uma longa cena de protestos em homenagem aos desaparecidos políticos, o velho intelectual, Gerardo, encontra-se com Carlos Gardel e San Martín - os três exilados. San Martín e Gardel falam a Gerardo - já cansado e doente - que finalmente é hora de voltar. Era o fim do filme, pois era o fim do exílio. “Lá e cá”, todos voltariam para reconstruir um país.

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