sexta-feira, 30 de outubro de 2009

"Machuca" por Luiz Marcos de Carvalho



O filme “Machuca” é uma co-produção Chile/Espanha/Inglaterra, dirigido pelo chileno Andrés Wood e ambientado no Chile em 1973, pouco antes da derrubada do governo socialista de Salvador Allende.

O filme retrata os acontecimentos do período, através do olhar de crianças, uma de classe média alta, Gonzalo (Matias Quer) e outros pobres moradores de barracos, Pedro Machuca (Ariel Mateluna) e suas famílias e revela traços biográficos do diretor.

Assim, o filme faz um paralelo entre a luta de classes que se desenrolava no plano macro político do Chile, com a situação individual dessas crianças e adolescentes.

Enquanto no plano político, o filme mostra as diversas tentativas do governo de instaurar uma situação mais justa, com uma diminuição das desigualdades entre ricos e miseráveis e as reações das elites e também o boicote insuflado pelas corporações internacionais, que viram seus interesses contrariados pela estatização de bancos e de empresas diversas, e principalmente das minas de cobre, no plano individual o filme mostra a repercussão desse quadro nas vidas desses jovens.

Os filhos das classes abastadas estudavam no melhor colégio, o St. George, dirigido pelo padre Mc. Enroe, um corpulento e vigoroso clérigo católico, que comungava com o ideário socialista e, que resolveu pô-las em prática, abrindo vagas gratuitas a vários alunos da comunidade carente que vivia nas proximidades do colégio.

Com isso o padre estava procurando diminuir a desigualdade social, criando uma ponte entre as classes e, também esperava estar seguindo a doutrina cristã, para a qual todos os seres humanos devem ser tratados como irmãos e filhos de Deus. Assim, o filme relata o destino simultâneo de duas utopias: o socialismo político e a doutrina cristã da fraternidade universal.

Tanto uma, como a outra, irão encontrar obstáculos instransponíveis: o socialismo, através da insurreição da burguesia que não iria abrir mão de seus privilégios e no plano individual, o reflexo desse ponto de vista se traduzia nos preconceitos dos colegas para com os “seus novos amigos”.

É possível superar esses obstáculos, esses preconceitos, profundamente arraigados na sociedade? É uma pergunta que está subjacente à narrativa fílmica. E, em ambos os casos, o filme mostra o que aconteceu: O malogro de ambas.

Inicialmente, entre os colegas Gonzalo e Machuca se desenvolve uma amizade verdadeira, que conduz a uma esperança de que as desigualdades pudessem ser superadas a partir dos indivíduos, principalmente das crianças, as quais ainda não estão definitivamente impregnadas do ódio entre classes, que vigora entre os adultos. Mas, tanto o contexto familiar como o político social, vão acabar por destruir essa iniciativa de convivência harmônica ensaiada por esses amigos que viviam em ambientes sociais tão diversos.

A situação política faz precipitar essa separação, com o acirramento dos ânimos de parte a parte, com as manifestações de rua dos defensores e dos opositores do governo de Allende. O resto é história (oficial) e assim prevaleceu mais uma vez o direito da força em detrimento da força do direito, sepultando, uma vez mais, a utopia de que um mundo melhor, mais igualitário, é possível.

Ainda que todas as utopias tenham fracassado desde o princípio, até nossos dias, isso não deve servir de motivo para que nós desistamos de alcançá-las, pois tal quadro seria ainda mais terrível do que o malogro das diversas tentativas até hoje efetivadas. O Homem não pode abandonar nunca seus sonhos de mais justiça e de mais igualdade, por mais longo e incerto que seja o caminho a ser percorrido. O Homem não pode desistir de lutar, como parece estar acontecendo hoje. Isso, sim, MACHUCA

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