domingo, 25 de outubro de 2009

"O pântano" por Luiz Marcos de Carvalho


Filme argentino dirigido por Lucrecia Martel é um retrato angustiante e denso de uma sociedade que perdeu seu rumo. Tudo no filme reforça a desordem mental e a falta de direção na vida dos personagens. Em meio a um ambiente externo exuberante, cercado de belas paisagens, montes e vales, florestas, tudo isso contrasta com a sujeira física e o descontrole mental dos personagens.

Há no meio ambiente um pântano no qual uma rês desgarrada imerge e fica presa, impossibilitada de escapar da areia movediça. Da mesma forma, os personagens encontram-se igualmente atolados em um pantanal ainda mais perigoso e da mesma forma se encontram incapazes de encontrar uma saída. Assim como aconteceu com o boi, que foi sacrificado, a única saída para os personagens seria também a morte? É uma pergunta que não é formulada explicitamente, mas que poderia ser aventada, uma vez que nenhuma outra saída é também indicada.

Mesmo as crianças e os adolescentes também são vítimas desse ambiente nefasto formado pelas relações existentes entre os membros da “família”, se é que se pode chamar assim a esse aglomerado de almas perdidas. Há uma adolescente, Momi, que costuma ficar vários dias sem tomar um banho e é chamada pelos outros de Momi a suja., embora eles também não estão isentos de defeitos similares e da degradação que é a regra geral.

A piscina que existe na casa tampouco, merece esse nome, uma vez que sua água é imunda; a “piscina” jamais foi limpa alguma vez e as pessoas dela se utilizam, como se fosse a coisa mais normal do mundo.

A sujeira e a desordem são visíveis por toda parte e se encontram em todos os diversos ambientes, com as roupas e lençóis jogados de qualquer forma, numa bagunça total que reflete também o estado interior dos personagens.

A protagonista e seu “marido” são alcoólatras e ela vive constantemente ébria o que termina por provocar um acidente em que ela se fere com os cacos de vidro das taças que deixa cair, aumentando ainda mais o grau de desorientação e confusão de todos.

Em todos os personagens há sempre uma falta de determinação, não há valores definidos nesse ambiente cercado de belas paisagens mas imerso numa apatia e numa indefinição psíquica, num atoleiro de paixões e vícios e na falta de um sentido para a vida. As crianças saem a caçar e seguidas vezes são mostradas cenas em que elas apontam as espingardas demoradamente, porém ficam indecisas e não chegam a efetuar os disparos.

Essa indefinição e o caráter vacilante dos personagens é também mostrado na idéia de uma projetada viagem à Bolívia, para a compra do material escolar dos filhos, porque seria mais econômico, e, também porque os personagens manifestam, embora timidamente o desejo de escapar ao ambiente pesado e sufocante que lhes incomodava, o que acaba por não se concretizar, deixando com que todos continuem no mesmo ambiente em que estavam imersos e a que de certa forma se acostumaram.

O filme não aponta saídas para o drama dos personagens. Fica para o espectador a análise do como e do porque uma situação como a mostrada é possível na realidade e quais as possíveis soluções.

É, em suma, um belo filme, que perturba e procura nos despertar da nossa apatia; que consegue com sua proposta estética, fazer-nos refletir sobre os rumos e descaminhos que podem surgir em uma sociedade que, por falta de espírito crítico, reflexão e iniciativa, extraviou-se em algum ponto de sua trajetória e viu-se perdida em meio a um “pântano” do qual não consegue escapar.

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