domingo, 25 de outubro de 2009

"Machuca" por Rayssa Costa


Utilizando como base os acontecimentos antecedentes ao golpe militar chileno, o diretor Andrés Wood mistura ficção e realidade para contar a comovente história de amizade entre dois meninos separados pelas diferenças sociais no Chile dos anos 70.
Entre os anos 1970 e 1973, o Chile viveu um dos períodos mais conturbados de sua atual história. Salvador Allende, o primeiro governante de ideais marxistas a conduzir o país, tentou colocar em prática um regime socialista. No entanto, foi pressionado pela extrema direita, que, com o apoio dos Estados Unidos, desejava sua renúncia. No governo, Allende praticou medidas que deixaram a parcela dominante daquele país em profundo estado de desagrado.

A partir dos fatos citados, Andrés Wood mostra ao mundo a narrativa dos meninos Machuca e Gonzalo. Gonzalo Infante e Pedro Machuca são dois garotos de 11 anos que vivem em Santiago. O primeiro, numa bela casa situada num bairro de classe média. O segundo, num humilde povoado ilegal instalado a poucos metros de distância da escola. Dois mundos separados por uma muralha invisível que alguns sonham em derrubar na intenção de construir uma sociedade mais justa.

Um exemplo de cidadão que luta pela igualdade entre as pessoas, é o padre McEnroe, o diretor do até então tradicional colégio Saint Patrick, instituição na qual Gonzalo estuda. Em meio à política comunista instalada por Salvador Allende no país, o diretor decide fazer uma integração entre tais universos, decide então abrir as portas do colégio para os filhos das famílias do povoado. É assim que Pedro Machuca vai parar na mesma sala de Gonzalo, ponto de partida para uma amizade cheia de descobertas e surpresas, a qual acontece paralelamente ao clima de enfrentamento que vive a sociedade chilena na violenta transição de Allende para Pinochet.

As aproximações e distanciamentos que advêm a partir da diferença de classe dos meninos compõem a chave da bela e incrível trama. Rejeitado pela maioria dos meninos, Machuca vê em Gonzalo um companheiro pouco preocupado com a diferença social que os separa. Do mesmo modo, Gonzalo, um menino solitário e que testemunha as traições da própria mãe, encontra no carinho de Machuca o alento para sua desventura.

Ao som de uma suave trilha sonora, Machuca e seu mais novo amigo descobrem juntos o sentimento de liberdade em um país sitiado. Gonzalo Infante carrega Machuca para todo lugar e lhe apresenta tudo aquilo que o dinheiro pode comprar e que o companheiro pobre certamente não teria acesso. Por sua vez, Machuca mostra ao colega todo o companheirismo e a dedicação que, diferentemente dos bens materiais, o dinheiro não é capaz de dar. Na favela, além da fidelidade de Machuca, o menino rico encontra o “primeiro amor”. Silvana é uma garota politizada que no primeiro momento debocha Gonzalo, mas aos poucos vai cedendo e acaba apresentando ao garoto a mais um mundo de sentimentos que ele não conhecia.

A inocência dos garotos frente às disparidades sociais do país toca o espectador. Os meninos estão alheios às disputas políticas, eles só sabem o que sentem. E é por isso que esse longa-metragem não caiu no clichê em hora nenhuma, o sentimento é traduzido de forma brilhante e simples. Juntamente ao que se sente, há a legitimação do momento político vivido. O cineasta consegue passar toda angustia dos chilenos que viveram os conflitos sociais na década de 70 através do olhar inocente de Pedro Machuca. É um belo filme.

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