sexta-feira, 30 de outubro de 2009

"O Pico dos Delírios (“El Topo” de Alejandro Jodorowski)" por Douglas Deó Ribeiro






Existem duas formas de fruir uma obra como “El topo”: ou se tenta racionalizar neuroticamente todos os potenciais símbolos deixados pelo autor, ou mergulha-se sensorial e oniricamente nas composições visuais e nos delírios narrativos. Ambas as formas tem suas vantagens e ossos; é uma questão de escolha.

Parece não haver muito sentido quando se tenta encontrar uma lógica – no sentido aristotélico do termo - no filme. Ele se propõe onírico, psicodélico, ilógico, corrente. É um western, mas o excesso de sangue, os símbolos cristãos, os personagens estranhos podem adquirir inúmeras interpretações na leitura de quem assiste.

Apesar dessa desorganização estrutural da narrativa, há muitas imagens de impacto bastante relevante, quer seja por uma profundidade de campo expressiva, quer por uma encenação em que um rigor aparentemente incompatível com a desorganização da história fica evidente.

Há duas observações importantes surgidas dessa dissociação forma-conteúdo: primeiro, numa proporção bastante exagerada, essa composição de aparência casual constitui um universo fílmico mais humano do que aqueles em que há um rigor excessivo no diálogo entre o discurso e sua forma – não significando que esta ou aquela maneira de trabalhar seja esteticamente superior. Em segundo lugar, uma dissociação intencional, em que há uma aparente ausência de conteúdo coerente, desloca o foco da obra para essa desconexão, como se houvesse um discurso acima do discurso imediato, como camadas de interpretação,

“El Topo” é um filme incômodo. Pode nausear um espectador comum – e muitos outros espectadores. Sua constituição, seus delírios apresentaram uma aceitação maior, talvez, por ocasião do seu lançamento porque havia um público cuja constituição ideológica era compatível com a liberação das amarras da lógica mental através do uso das drogas e de tantos outros recursos subversivos. Por isso, como a maioria – ou todas – as obras, o filme é melhor apreendido quando se pensa nele inserido em seu contexto.

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